
Academias de rua e a controvérsia sobre a presença (ou não) de profissionais
Como iniciativa no combate ao sedentarismo, alguns estados do país têm adotado como política pública a instalação de academias de rua, de utilização livre e gratuita, sem profissionais capacitados para orientar seus usuários. A ação, que tem o viés benéfico, vem acompanhada de uma controvérsia: não existe a obrigatoriedade de toda academia contar com profissionais, sob risco de o uso incorreto provocar graves lesões e até a morte de frequentadores?
A questão põe em foco a real aplicação dessa obrigação que consta em legislação. E enquanto ela vale para empresas privadas, o Estado dessa forma a descumpre, sem sequer ser advertido, autuado, multado ou interditado.
Nessa polêmica, entram também as academias instaladas nos condomínios, outras residências e até mesmo as diversas faixas de ruas das cidades que aos finais de semana são fechadas para a circulação de bicicletas. O que se vê é uma incoerência na aplicação da lei: ou todos são obrigados ou ninguém é. Trata-se de um conceito mínimo de justiça. Se o argumento é a segurança, então, deveria valer para todos.
Contudo, há uma outra questão. Esse argumento da segurança é real? Exercício é tão perigoso quanto qualquer outra atividade que traz consequências caso seja executada de maneira errada. Vale, por exemplo, para a condução de um veículo ou até mesmo para o ato de cozinhar. Para ambas as ações, ensinam, verificam se você sabe e então já pode executá-las sozinha.
Alguns defensores da categoria podem dizer que a obrigação é válida para garantir o trabalho de profissional de Educação Física. Outros afirmam que ‘se o professor é bom, ensina e o aluno aprende’.
Entretanto, para o primeiro argumento, é diferente quando a empresa é obrigada a contratar um profissional, porque a exigência se transforma em custo e não em investimento, logo entrando no rol de cortes para redução do orçamento para o bom funcionamento do negócio. Para ter valorização, a contratação deveria ser opcional, por desejo ou ainda por sentir que o negócio realmente precisa desse tipo de profissional, vendo nele a capacidade de gerar resultados e lucros para o negócio.
Para o segundo argumento, é preciso destacar que com dois ou três alunos treinando juntos, o professor já não consegue olhar com 100% de atenção para todos, por todo o tempo. Ou é um ou é outro. Imagine, então, numa sala com 20, 30 ou 50 alunos? E no sentido da segurança, vale lembrar que o agachamento, por exemplo, é um movimento comum que toda e qualquer pessoa faz no ato de sentar e levantar de uma cadeira, e ainda que seja simples e rotineiro, traria riscos, caso fosse realizado de forma errada. Nem por isso, há necessidade de o movimento ser realizado sempre com o acompanhamento profissional.
O problema maior não é uma empresa vender o espaço sem serviços, desde que deixasse claro para quem o compra, registrando que ali é para quem já tem conhecimento necessário e que a responsabilidade é do próprio frequentador. O que não pode em hipótese alguma e que possui grande perigo é haver gente sem formação específica vendendo o serviço ou mesmo instruindo. Isso sim fere a lei de maneira grave e vale para todas as pessoas e instituições públicas e privadas.
Enquanto a exigência para a presença de profissionais de Educação Física valer apenas para empresas privadas e não para todos, os locais de prática de atividade física, esta será vista apenas como norma burocrática, e não de efetiva segurança. Até porque a utilização dos equipamentos e espaço sem orientação já existem, mesmo nas academias, onde muita gente entra e sai sem nem falar com os profissionais, ou seja, não estão usando serviços, cuidados nem orientações.
*Cristiano Parente é professor e coach de educação física, eleito em 2014 o melhor personal trainer do mundo em concurso internacional promovido pela Life Fitness. É CEO da Koatch Academia, do World Top Trainers Certification, primeira certificação mundial para a atividade de educador físico.
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